Por meio de seu Núcleo de Apoio à Diversidade, a Trensurb promoveu, na quarta-feira (29), seminário interno alusivo ao Mês da Consciência Negra, intitulado “Racismo Estrutural e Ambiente de Trabalho”. Na ocasião, o auditório da empresa recebeu quatro convidados: Iyá Sandrali Bueno, presidenta e coordenadora estadual do Movimento Negro Unificado/RS; Letícia Padilha, advogada, presidenta da Comissão da Igualdade Racial da OAB e integrante do Movimento Negro Unificado; Jorge Terra, procurador da PGE-RS, presidente da Comissão sobre a Verdade da Escravidão Negra da OAB-RS e coordenador da Rede Afro-Gaúcha de Profissionais do Direito; Gleidson Renato Dias, membro da coordenação nacional do Movimento Negro Unificado.
No início do evento, diretores da Trensurb manifestaram-se sobre a importância do seminário. “A questão racial no Brasil é uma questão urgente, então a Direção da Trensurb está disposta para que esses temas sejam trazidos e tratados, mas que também não fique apenas na teoria, vamos nos envolver através do Núcleo e das discussões”, afirmou o diretor de Operações, Ernani Fagundes. A diretora de Administração e Finanças, Vanessa Rocha, disse acreditar que a atividade configurou um “marco muito importante” para a empresa. “Com esse importante debate, vamos poder trazer uma efetividade nas ações políticas e afirmativas de combate ao racismo e à intolerância no ambiente de trabalho”.
Primeira dos convidados a fazer sua fala, Iyá Sandrali Bueno teceu comentários a respeito dos ambientes de trabalho e as dificuldades enfrentadas nesses espaços principalmente durante a pandemia. Ao falar sobre o assunto, ela trouxe trechos de um artigo que consta em seu livro Pelo direito de ser quem eu sou, o ser coletivo, buscando falar não apenas de racismo, mas também de sua visão de mulher negra e servidora pública. “Minha rusticidade de servidora pública se constitui de aspectos que se apresentam com intensidade e orgulho, no sentido místico do significado servir ao público”, afirmou. Ela concluiu falando: “O ambiente de trabalho precisa ser observado com amorosidade por aqueles que deveriam controlar o uso de sua caneta quando se trata de assinar decretos que tratam da vida dos servidores públicos, independente de governo e governança”.
Leticia Padilha, por sua vez, buscou explicar as origens do racismo estrutural e institucional que vem de séculos e perdura até hoje: “No nosso país, tivemos quase 400 anos de escravagismo e somos o último país das Américas a abolir a escravidão de uma maneira formal. Na verdade, ela só foi formal, pois nós vivemos os seus reflexos até hoje. Nós fomos colocados em uma linha de inferioridade pelo racismo estrutural, o racismo estabelece uma visão de hierarquia entre raças no sentido sociológico, afinal biológico já foi provado que não existe”.
Já Jorge Terra abordou o racismo no ambiente de trabalho e as políticas públicas: “As políticas públicas precisam fazer ações valorizativas e afirmativas, mas friso no ‘valorizativas’, pois são aquelas que levam ao direito da diferença. Por exemplo, tem um pesquisador que foi em Ruanda para saber o motivo de ter acontecido um genocídio lá. A conclusão foi que: primeiro, eu desvalorizo aquela pessoa; segundo, eu a discrimino; e, terceiro, eu gero uma desigualdade, com ela, eu faço associações, com a pobreza, marginalidade e assim vai. Dessa forma, eu fecho o ciclo e desvalorizo essas pessoas”. Conforme Terra, “por isso, ações valorizativas são importantes, pois elas prezam pelos valores humanitários, que mostram que essas pessoas que estão sendo desvalorizadas são pessoas, então as empresas precisam levar isso em consideração quando forem fazer suas políticas internas”.
Último dos convidados a se manifestar, Gleidson Renato Dias também abordou as origens do racismo e o modo como ele persiste até os dias de hoje: “Primeiro, tem o racismo de 1500 a 1888, que era considerar os negros como não seres humanos, sendo escravizados. Depois disso, veio a classificação de sub-humano, então essas pessoas receberam subcidadania, uma lógica disso é que, a cada dez pessoas pobres, oito são negras, pois é considerado que essas pessoas devem ter subempregos. Para o povo negro, tem um lugar específico, podem ser mestres, mas mestre-sala e podem ser rainhas também, mas de bateria”. Sobre a relevância de se debater o tema do racismo estrutural Dias, declarou: “O Brasil é o país onde a polícia mais mata e mais morre também. Quem a polícia mais mata são as pessoas negras e os policiais que mais morrem são os negros, isso é racismo estrutural e por isso é tão importante esse debate”.
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